quarta-feira, junho 28, 2006

pills

Entre X-men’s e ciborgues, a sociedade pós-moderna vai encontrando uma forma de superar sua condição humana. “Errar é humano”, diz o ditado conhecido por todos, entendido por muitos, aceito por poucos. O objetivo é constantemente a perfeição. Cem por cento de aproveitamento, recompensa por produtividade, destaque entre os outros. Eu sou o funcionário do mês. Top ten, número um.

Quem paga pela capacidade de realizar vinte tarefas ao mesmo tempo? O novo Windows men, o homem multitarefa, pode fazer mais que Bom Bril. Pode não; deve. Pró-ativo. Um dos novos rótulos que mostram o produto de uma sociedade na qual não há mais tempo para nada. “Ah, não consegue?! Sai. Tem quem consiga...”, é a nova frase que oprime cada vez mais o sujeito que sai de casa para ganhar a vida, ganhar amor, ganhar satisfação. Mais do que qualquer coisa, ganhar. Vitória sempre. Eis o lema. Mas quem paga? Paga o corpo, paga a mente, paga o sujeito. Paga com um pedaço. Pedaço de quê? Às vezes de corpo. “Pronto, ficou bonito não? O que você acha?”. “Tá bom, doutor. Bem o que eu queria parecer...”. Às vezes de saúde, às vezes de felicidade. Velocidade. “Nokia. Connecting People.”. Coloque seu cabo na porta USB do umbigo. Assim você pode descarregar seus contatos, músicas e agenda diretamente, sem necessidade de aparelhos. Me aparelhe. Aparrelho.

Mas você não precisa ser biônico. Não precisa ser ciborgue. Tome uma das novas pílulas que lhe mantém acordado por três dias. Trabalhe por três dias sem interrupção. Você vai ser destaque de qualquer jeito. Se prepare, pois a nova geração de pílulas também faz você captar o sinal de celular, ouvir mais longe, ser mais rápido. Destaque-se. É o Homem-Lego. Cada pedaço faz uma tarefa. É o seu upgrade na carreira. Cheira. Cheira que dá conta. A conta aumenta. Aumenta o homem, aumenta o prestígio, aumenta tudo.

Selecione. Você já passou por isso, já foi selecionado. Pode escolher entre tantas características. Não, você não está no bordel. A confusão é outra. Organiza aí. Cabelo verde, olhos brancos, salta vinte metros. É o filho-gafanhoto. Não vai ter tal doença, não vai ter tal problema. Que bom, não vai ter nada. Vai ser bem higiênico. Que maravilha. Já pensou? Pode ser que o nome venha escrito na testa. “Olha que amor! É a cara do doutor!”.

E a cada pílula ou seleção de DNA, o homem vai escancarando a vontade/incapacidade de superar limites, controlar a vida, adoecer cada vez mais, ser, pedacinho por pedacinho, menos humano.

E tem gente que ainda se espanta com X-men e Exterminador do Futuro.


Lucas Fabbrin

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